De jogadora a caster: a trajetória de NapeR e a presença feminina no esports

Ex-jogadora profissional e caster de VALORANT, napeR compartilha jornada que trilhou para ter os games como carreira

Foto: Reprodução/Riot Games

O mundo do games, infelizmente, é conhecido e visto por muitas mulheres como um espaço que não as recebe de braços abertos. A primeira opção de presente para uma menina nunca é um videogame e, quando ela tem acesso a esse universo de jogos, nunca há um estímulo ou compreensão externa do porquê ela gosta de algo “essencialmente masculino”. No entanto, apesar de todas as barreiras e estigmas sociais, as mulheres têm mostrado que para saber mexer num teclado, controle ou analisar algum jogo, o gênero não importa.

Como exemplo feminino que conseguiu adentrar cenário profissional de esports, a Stellae te apresenta abaixo a trajetória de Camila “napeR” Naper, ex-jogadora profissional de Counter-Strike: Global Offensive (CS:GO), VALORANT e caster convidada para o VCT Game Changers Brasil.

MUDANÇA NO PLANO DE CARREIRA E CONQUISTAS

Foto: Reprodução/Riot Games

Formada em Design Gráfico e sendo técnica em Segurança no Trabalho, napeR quase não assumiu os esports como objeto de trabalho. Caso a vida tivesse seguido um rumo diferente, ela estaria longe dos stages e seguiria como técnica em segurança no trabalho.

Apesar de ter escolhido a decisão difícil de se profissionalizar em jogos competitivos de FPS, napeR registrou em sua carreira como jogadora a chance de representar diferentes times e de disputar campeonatos internacionais fora do Brasil.

“Conquistei muitos vice-campeonatos no CS:GO, alguns títulos e tive a chance de disputar um mundial em Dubai representando o meu país, no qual fiquei em terceiro lugar. Tive a oportunidade de representar um time argentino (9z Team) e foi praticamente meu último time no CS. No VALORANT, não cheguei a competir por muito tempo (um ano e meio). Representei a ODDIK, Cruzeiro eSports, TROPICAOS e NOUNS.”

Depois de oito anos competindo, a “virada de chave” na vida da ex-jogadora aconteceu quando ela foi convidada a comentar um jogo do VCT Game Changers Brasil e descobriu uma nova paixão: a comunicação.

“Analisar e comentar os jogos é sempre um desafio muito gostoso, amo fazer parte da competição e estar participando dos jogos como caster. Essa é uma forma de continuar com a chama da competição ativa.”

OS JOGOS COMO ESCAPE E LUGAR DE AFIRMAÇÃO

Foto: Matheus Legolas/BBL

Desde mais nova, napeR tem contato com o universo dos jogos por causa de seu pai, já que, segundo ela, “desde que se conhece por gente, tinha videogames em casa”. Jogos como Prince of Persia, Carmen San Diego, Resident Evil fizeram parte de sua infância e adolescência. Em 2005, napeR descobriu o jogo em que começaria a sua carreira mais para frente em 2016. Seu “primeiro campeonato” foi entre os vizinhos de seu prédio.

“Em 2005, mais ou menos, descobri o Counter-Strike 1.6 e ficava jogando com bots. No prédio onde eu moro, tinha uma galera entre a mesma faixa de idade que a minha e a gente fazia campeonatos – um dos vizinhos tinha dois computadores. Em 2008, foi quando um desses meus vizinhos me apresentou o CS Online, e daí começou uma paixão.”

Em 2013, napeR encontrou no CS uma válvula de escape no momento de turbulência de sua vida.

“Foi uma das piores épocas da minha vida [2013] e usei o jogo com válvula de escape: saí do CLT, estava passando pelo caos de me assumir sexualmente e o término de um namoro. Foi dolorido demais e me fez aprender demais também, inclusive, no CS, foi o período em que eu comecei a me aprimorar mais e mais no jogo.”

Após anos já envolvida e com a paixão declarada pelos games, napeR viu a possibilidade de transformar o hobbie em profissão. Assim, saiu dos campeonatos de condomínio e entrou de cabeça nos campeonatos profissionais.

“Somente em 2017/2018 que percebi que [jogar] poderia ser uma profissão. Foi onde as coisas começaram a dar certo: estrutura, destaque nos jogos, campeonatos internacionais acontecendo e vi que poderia ter um futuro. O turning point foi o ano de 2019. Foi o melhor ano da minha carreira disparado: era MVP em quase todos os jogos e tive a oportunidade de levar meus pais pra assistir um campeonato onde ganhei a vaga pro internacional.”

DESAFIOS, GÊNERO E INSPIRAÇÕES

Foto: Repdrodução/Riot Games

O principal desafio enfrentado pela ex-jogadora era a garantia do futuro. napeR precisou mostrar para seus pais que o jogo que ela jogava por diversão também poderia ser o sustento para sua vida e vocação. Ser mulher foi uma dificuldade a mais em sua vida, porém, ela seguiu esperançosa e agora se alegra de ver que a presença de mulheres no cenário está aumentando gradualmente desde que ela começou.

“O fato de ser mulher impactou demais. Sabemos que hoje em dia o investimento e o reconhecimento são difíceis, imagine há quase 10 anos atrás? Fico feliz de ver que hoje algumas mulheres já podem viver do sonho com um respaldo gigantesco perto do que eu tinha. Óbvio, ainda tem muita luta, muita coisa que precisa melhorar, mas fico feliz de ver que as coisas já estão se encaminhando de alguma forma.”

O questionamento mais difícil para napeR, com certeza, foi citar os nomes de todas as mulheres que a inspiram em sua carreira profissional e também pessoal. Deixamos na íntegra a fala da caster com todos os nomes das mulheres incríveis citadas pela mesma:

“Eu ficaria horas dizendo vários e vários nomes. Quando eu competia: Potter, Petra, Juliano, Camyy, Santininha, Pan. ‘Vixi’, tem uma galerinha, hein? Depois que virei caster, ainda continuo admirando essas mulheres incríveis, mas pude abrir o leque e passei a admirar: Bah Guetirrez, Chun, Nessy, Beatriste, a própria Santininha que também virou caster. ‘Tô’ com medo de soar injusta, mas tem MUITA mulher foda que eu acompanho diariamente e me inspiro. Sem falar nas mulheres da “nova geração”, né? Daiki, AntG, Blu, Bstrdd, Sayuri, Mel e por aí vai… Isso porque ‘tô’ falando da área em que atuo, mas se for puxar o gancho para todas as mulheres que me inspiram na vida, ‘aiaiai’…”

NAPER TAMBÉM É INSPIRAÇÃO

Foto: Reprodução/Riot Games

Se já é difícil se provar na sociedade como mulher, imagina em um cenário predominante masculino como os esports. Apesar dos percalços, napeR não mudaria nada na sua trajetória e se orgulha veementemente de tudo que passou e onde chegou. A caster consegue descrever apenas em uma palavra o sentimento de se tornar inspiração para outras várias mulheres que desejam entrar no cenário e que são apaixonadas por videogames: orgulho.

“Se eu pudesse descrever em apenas um sentimento, seria: ORGULHO. A gente sabe o quanto é difícil se manter nesse ambiente que muitas vezes nos diminui só pelo fato de sermos mulheres. Olho pra trás e vejo todos os caminhos que percorri e hoje em dia, eu não vou mentir, não faria nada diferente. Melhoraria algumas situações, mas viveria tudo de novo.”

Você mulher, você jogadora, você amante de jogos: fique com a fala de napeR direcionada para cada uma que deseja estar marcando sua presença no cenário de esports.

“Se você tem o sonho de ser jogadora ou caster ou QUALQUER coisa dentro dos esports: acredite em você e trabalhe pra isso! Nós somos incríveis e somos fodas! Merecemos estar onde quisermos e eu tenho esperança e fé que um dia nós vamos mostrar cada vez mais o quanto somos boas e o quanto AMAMOS jogar/falar/analisar/comentar/produzir. Sempre digo que se eu for capaz de inspirar UMA menina, o meu trabalho foi concluído e quero também poder abrir portas para mais e mais mulheres no mundo dos esports. O mundo é nosso, eles que ainda não sabem disso! Exaltem a sua verdade, sempre.”

GGIRLS

Se ainda há espaços que não recebem a presença feminina de braços abertos, há várias mulheres que já mostraram que é só abrir eles com força e determinação. Assim como napeR, garanta seu espaço e mostre o porquê ele é merecidamente seu. Seja jogando, analisando, comentando, produzindo, escrevendo, as mulheres do cenário de esports estão provando todos os dias o pertencimento delas. O cenário de games não é e nunca foi só para o público masculino, estamos aqui e vamos ficar!

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